27 de outubro de 2016

Dia 5: Tempestade

Há uma tempestade armada à distância. Vejo-a medonha no horizonte onde imagino que a estrada me leva. Adoro tempestades. Chego a persegui-las de propósito. Sonho ir ao Kansas ao "Tornado Alley" em busca de tornados. Até já estive num simulador de tornados. Mas, neste momento, em que vejo o monstro, a adrenalina da excitação mistura-se com o receio da insegurança em que me encontro. Isto não é um simulador onde eu estou confortavelmente presa a uma correia de protecção. Isto não é uma excursão guiada por peritos que nos levam a ver tornados e fenómenos de tempo extremo a distâncias de segurança. Isto é a realidade como não há mais realidade.
Estou a sair do Texas para o Novo México. A estrada é vazia de tudo. A paisagem é solidão. Os campos de petróleo ficaram para trás. Não há gente, não há uma vila, um rancho, um nada e eu sei bem o perigo que é ser-se apanhado por uma destas tempestades de monção. Formam-se em menos de nada e varrem tudo à sua passagem. Não há escapa. Se páro o carro, ela atinge-me parada À espera. Se prossigo, ela atinge-me em andamento. Não há fuga. Sigo.
Abate-se de repente e parece que vai destroçar o carro. Em menos de um segundo, a visibilidade passa a zero. Breu. Os limpa-vidros não dão vazão ao dilúvio no pára-brisas. Não posso parar porque estou na estrada e alguém pode vir contra mim, por trás, em contra-mão, sei lá. O que eu não vejo, os outros também não vêem. Não gosto do medo destes minutos. O carro segue a 10, a 5kms hora. Não sei se estou na estrada se fora dela. Espero o pior. Para mais, há vários quilómetros que nenhum dos telemóveis apanha rede. Segurança zero.
 Sair da parede de água é como emergir para um mundo outro. Sente-se fisicamente sair de sob o peso da água e de dentro da escuridão. Mudança automática e repentina. Alívio imenso e surpresa por não haver um pingo de água no piso da estrada fora da tempestade. É como se uns escassos metros atrás não andasse ali um monstro molhado. Surreal. E sem aviso, um letreiro minúsculo na berma da estrada diz que entrei na Mountain Time Zone. Zonza com a adrenalina que ainda me está bombeada no corpo não sei se adianta ou atrasa a hora. Só me importa que não tive nenhum acidente enquanto andei dentro do bicho. Não sei, ainda, que esta não será nem a última e muito menos a menor das tempestades que se vão atravessar no meu caminho nesta viagem. Para já basta-me saber que atravesso a "state line" e entro no Novo México.

1 comentário:

Dalma disse...

Que susto! A descrição que faz não tem nada a ver com o que passei na Geórgia onde a tempestade que atravessámos foi só de vento, nada de chuva! E tive medo, mt medo!