... is where the heart is.
E o meu coração está nesta casa. Aqui, com os meus espíritos, o meu passado, as boas e as más memórias, os espaços que conheço de cor, o cheiro a madeira antiga, o eco das escadas, o jardim.
Hoje. Hoje, estaciono à frente do portão e olho a minha casa com os olhos da primeira vez. O que será que vê quem vê esta casa pela primeira vez? A bougainvília fúchsia que cresce desmedida e que a Mãe plantou. A hera que eu plantei. As árvores sem nome que eu trouxe do Egipto dentro de uma garrafa de água vazia. As flores que o Sr. Luís plantou na Primavera e sim: o Spotty que percorre o seu reino com a pose de dono e a relva com os carreiros que ele abre nas suas deambulações. Home. My home. My heart.
Entro. Está fresco. A frescura calma que a minha casa tem no Verão, graças às ideias isolantes do Pai que a construiu anti-sísmica quando não se falava disso. Deposito as chaves na mesinha da avó Ária (sim, Ária). Subo à biblioteca que já foi do Pai, que a Mãe idealizou no papel e que hoje é só e tão completamente minha. Levo ideias de purga e a vontade derradeira que me tem faltado nestes últimos meses, pelo tanto que tenho sempre que fazer, pelo cansaço provocado por outras arrumações de quem tira alguém da vida. Há já muito pouco da outra existência. Mas esse pouco é para ser erradicado, agora, com a urgência vital que me toma de arremesso.
Papéis insignificantes, tão quanto os do meu casamento de papel esboroado, revistas que nada me dizem, disquetes de quando os computadores tinham disquetes, caixas de vídeo, molduras vazias: esqueletos de vidas passadas tão ocas quanto as molduras esventradas. Nada me dá nostalgia, nada me evoca nada. Será possível este nada? Este desapego? Este nada emocional? Tão nada que nem chega a ser vazio. Um nada que não me perturba e me deixa incólume à sua não-existência.
Cada coisa que sai é espaço meu que entra. Escorro suavamente para dentro da casa grande, "obscenamente grande para uma só pessoa", dizia eu por estes dias. Quero desmedidamente ocupar o espaço, o meu espaço. Apoderar-me das divisões onde nunca entro. Quero sê-las mais do que tê-las. A casa que é um pedaço tão grande de mim, como grande ela é. "Obscenamente grande para uma só pessoa"... Não me importo mais. Não me incomodam mais os ecos da minha única presença. Não me perturba mais o espaço em que me perco. Vou vivê-la com a vida de uma nova vida: a minha.
E o meu coração está nesta casa. Aqui, com os meus espíritos, o meu passado, as boas e as más memórias, os espaços que conheço de cor, o cheiro a madeira antiga, o eco das escadas, o jardim.
Hoje. Hoje, estaciono à frente do portão e olho a minha casa com os olhos da primeira vez. O que será que vê quem vê esta casa pela primeira vez? A bougainvília fúchsia que cresce desmedida e que a Mãe plantou. A hera que eu plantei. As árvores sem nome que eu trouxe do Egipto dentro de uma garrafa de água vazia. As flores que o Sr. Luís plantou na Primavera e sim: o Spotty que percorre o seu reino com a pose de dono e a relva com os carreiros que ele abre nas suas deambulações. Home. My home. My heart.
Entro. Está fresco. A frescura calma que a minha casa tem no Verão, graças às ideias isolantes do Pai que a construiu anti-sísmica quando não se falava disso. Deposito as chaves na mesinha da avó Ária (sim, Ária). Subo à biblioteca que já foi do Pai, que a Mãe idealizou no papel e que hoje é só e tão completamente minha. Levo ideias de purga e a vontade derradeira que me tem faltado nestes últimos meses, pelo tanto que tenho sempre que fazer, pelo cansaço provocado por outras arrumações de quem tira alguém da vida. Há já muito pouco da outra existência. Mas esse pouco é para ser erradicado, agora, com a urgência vital que me toma de arremesso.
Papéis insignificantes, tão quanto os do meu casamento de papel esboroado, revistas que nada me dizem, disquetes de quando os computadores tinham disquetes, caixas de vídeo, molduras vazias: esqueletos de vidas passadas tão ocas quanto as molduras esventradas. Nada me dá nostalgia, nada me evoca nada. Será possível este nada? Este desapego? Este nada emocional? Tão nada que nem chega a ser vazio. Um nada que não me perturba e me deixa incólume à sua não-existência.
Cada coisa que sai é espaço meu que entra. Escorro suavamente para dentro da casa grande, "obscenamente grande para uma só pessoa", dizia eu por estes dias. Quero desmedidamente ocupar o espaço, o meu espaço. Apoderar-me das divisões onde nunca entro. Quero sê-las mais do que tê-las. A casa que é um pedaço tão grande de mim, como grande ela é. "Obscenamente grande para uma só pessoa"... Não me importo mais. Não me incomodam mais os ecos da minha única presença. Não me perturba mais o espaço em que me perco. Vou vivê-la com a vida de uma nova vida: a minha.
9 comentários:
A construção anti-sísmica tem esse condão: torna as casas mais frescas.
Mais do que a casa, a nossa casa é o regresso que saudamos, existe muito de imortalidade a cada regresso...
Renovo todos os meses o prazer do regresso a casa. àquela que me viu crescer, mas que abandonei há muitos anos. Quando parto e regresso à casa onde vivo, sinto sempre aquela sensação de que deixei um bocado de mim. Espero poder voltar muitas vezes à minha casa. Porque aquela em que vivo só é minha porque a adoptei há meia dúzia de anos. regresar a esta, não tem o mesmo sabor. Será que nas casas, como no amor, não há nenhum como o primeiro?
Pela tua descrição... parece uma casa linda...
ainda mais porque... tu tens imenso carinho por ela... e so por isso ... vale a pena ;)
"vivê-la ...
nova vida ...
minha"
se o Gabriel disse
Viver Para Contá-la
tu dizes
viver para vivê-la
a mim apetecer-me-ia dizer
viver a minha vida nova
talvez questões de estilos (literários?) ou formas (poéticas?)
mas é verdade que retive da tua frase original as palavras apenas que me davam jeito:
viver
nova
vida
minha
olha, só isto é um poema, as tuas quatro palavras, assim alinhavadas, poesia
é giro como as palavras brincam
é giro como as letras se misturam
giro como entre letras e palavras
os sentidos se formam deformam encantam vislumbram transcendem volatilmente enredados quais espíritos antigos, antigos como os antigos, homens antigos, sabedores, de tempos e tempos e antanho; gosto de me perder por entre palavras e descompassos
é, isto é mal de sono ou des-sono (que não insónia, só cansaço), estou cansado e no cansaço disparato, as minhas desculpas
vou-me
e parabéns
deve ser muito bom viver uma vida nova, quase apetece dizer, "talvez com um pouquinho de inveja", como isso deve ser bom
e adivinha, de quem são as aspas? um doce se adivinhares :-)
home sweet home...
Blondíssima,
não será a casa demasiado pequena para o grande que tu és?
Muitas vezes dou por mim a regressar a casa, liquefazendo-me num outrar-me, queria sozinhar-me quando te queres multiplicar em partilha...
leio-te e penso que somos mesmo bichos insatisfeitos. Temos de um tudo e queremos o nada...
Outrar-me é uma necessidade impassível, de quando sinto que sozinhar-me se impõe num mundo em que a partilha é toda a minha vida...
A casa, sim, a casa é o universo visto com as cores de dentro... e é nela que me descondo, que me desabrocho, que me permito outrar a horas impróprias aos outros que me rodeiam e me partilham e me completam e me permitem querer sozinhar-me...
Assim sendo e sendo o teu inverso, como eu te compreendo...
indomável
É curioso como encontro ecos das tuas memórias nalgumas minhas...
É um belo texto sem dúvida que permite a mente vogar ao sabor do seu próprio passado...
...a incluir nos "best of "!
Há no entanto um cuidado a ter: não deixar que as nossas "homes" se tornem apenas "houses", daquelas caprichosas que só exigem manutenção,pagamentos ao banco e limpezas...verdadeiros grilhões que impedem muito boa gente de levantar vôo!
Lindo o teu texto. E cheio de futuro.
Beijos
:))
[Estás a tomar conta muito bem do teu "noch nicht". Parabéns]
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