23 de maio de 2010

O meu post não ia ser isto...


... mas, ao regressar e abrir aqui o blog, vi ali em baixo o comment do Implume e pus-me a pensar - o que é sempre uma coisa propensa a resultados estranhos.
E o Implume diz qualquer coisa de eu ter sempre um abismo à minha frente, e não percebo bem (aliás, nem bem nem bem mal) aquela de não retorno à casa e ao cãozinho e à Paula com as suas flores e mimos e à província disfuncional que nos rodeia e onde, pelos vistos, eu moro na maior parte do meu tempo. Hmm...
Mas eu regresso sempre aqui à casa, ao Spotty, aos mimos da Paula, que, desta vez, me deixou uma garrafa de vinho "caseiro" (dizia no bilhete que acompanhava) emoldurada num laço encarnado e que foi o marido que "fez questão" (também lá estava no bilhete) de me deixar. Regresso aqui à província disfuncional. Levo horas entre o estacionar o carro, tirar as malas e entrar em casa. Primeiro passo ronda ao jardim: a árvore que plantei antes de ir de viagem dá mostras de não se ter aguentado, as nêsperas, que ficaram amarelas de verdes, estão côr-de-laranja e engelhadas. Presumo que deve ter estado muito calor. Em Londres estava de morte (o calor, claro). As rosas, por seu turno, estão lindas e abertas de vida de tal modo que as pétalas pesadas lhes caem despudoradas. A relva foi cortada na minha ausência. Sim, gosto destas coisas do meu mundo provinciano. Gosto de reencontrar o Spotty que primeiro me ignora, castigando-me pela ausência, e que depois me traz a bola para eu brincar com ele. E brinco. E rego a árvore moribunda. E olho o meu mundo de verde e flores com os olhos do coração e de me ver dona dele não o deixando naufragar e vendo o tudo, o tudo que gira no meu mundo de mulher que regressa a casa. À casa vazia onde finalmente entro. As persianas corridas e as janelas abertas que adivinho se devem aos cuidados e esmeros da Paula que não deveria querer que eu entrasse numa casa abafada por estes dias de clausura. Estou só aqui, mas adivinho a presença dos que me amam e espanto-me. Espanto-me todos os dias agora que me vejo a mulher que eu não sabia que era.
Regresso de um mundo cosmopolita que amo. Regresso nas roupas não-provincianas. Regresso com livros. Tantos livros: livros de viagem, das viagens que me correm no sangue nómada, romances, a biografia do meu idolatrado, amado e endeusado David Attenborough, um livro do John Simpson em viagem às terras de ninguém. Regresso a cheirar a aeroporto. Regresso cansada mas regresso feliz. Feliz por ter ido. Feliz por regressar. Aqui. Ao meu mundo de casa grande com o cãozinho e os mimos da Paula. Aqui onde eu também sou eu. Onde me descubro por entre memórias dos que já partiram. Entre ecos de divisões não habitadas. Entre o passado e este presente que se quer futuro e já é passado. Disfuncional? Talvez. Mas sou eu aqui e eu gosto do aqui. Não vejo abismos. Preenchi-os de terra. Atravesso-os a vau. Podem lá estar mas, por enquanto, não me engolfam.
O meu post não ia ser isto, mas acabou por ser.

6 comentários:

antonio ganhão disse...

Uau! Uma Blonde que pensa, que tropeça em si mesma, surpreendida por finalmente se reconhecer... uma Blonde enamorada.

Blondewithaphd disse...

Enamorada de mim, sim, finalmente.

Joaninha disse...

Bom ter-te de volta...dessas formas todas em que voltas...
Seja bem vinda minha cara Dra Blonde.

Beeeijos

António de Almeida disse...

Home sweet home. No final existirá sempre um porto de abrigo, onde descansar e retemperar forças...

Goldfish disse...

É de certeza um privilégio ter acesso ao melhor de dois mundos - o cosmopolita da cidade e da universidade e dos trabalhos internacionais e o tranquilo e repousante da "terrinha". E disfuncionais somos todos, uns mais que outros, é certo, sendo que os piores são aqueles que se acham totalmente normais. Os pobres não se conhecem de todo, nem ao mundo em que vivem. Por vezes, espanta-me que sobrevivam.

mdsol disse...

:)

[Muita pressa, minha linda]