Associo o amor à capacidade de sofrer que nos é intrínseca enquanto espécie pensante. Se calhar por isso nunca tive filhos. Talvez que me proteja de mais e maiores dores não os tendo. Lembro-me bem do sofrimento que foi assistir à tomada de posse do cancro nas nossas vidas quando ele nos entrou porta dentro para reclamar a Mãe, que nos era, aliás, o ser mais eterno. Lembro-me de sonhar com a morte dela quando ela ainda estava viva e de sonhar com a morte dela depois de ela morrer. Hoje sonho com ela viva e acordo no vazio da realidade que a sua ausência criou. Seja como for, esses sonhos são de angústia e doem pela perda irrecuperável. Associo, portanto, o amor extremo à dor extrema.
Ainda não tinha sonhado com o meu sobrinho. Sonhei que no-lo tiravam. Sonhei que a minha irmã ficava sem ele e que eu assistia impotente àquilo tudo e tinha de confortá-la estando eu destroçada de igual modo. Acordei inundada de tristeza e aliviada por tudo não ter passado de um sonho nefasto. Mas fiquei a pensar que sonhar uma coisa destas significa que o meu coração já adoptou de tal maneira o meu sobrinho que amá-lo significa temer perdê-lo, amá-lo incute-me a dor em todas as suas potencialidades.
Na verdade, esta coisa lata do amor tem muito que se lhe diga. Acho que, de certa forma, tenho medo dele por ter medo de sofrer quando ele me for amputado. Esquisito isto. Esquisita esta coisa de o amor ser o extremar da antítese. A coisa que maiores felicidades nos traz é também a coisa capaz de nos dilacerar em maior profundidade. Ó meu Deus, mitigai-me ao sofrimento dos que amo.
2 comentários:
Gostei muito,Blonde. Muito
Partilho a mesma opinião em relação ao amor e, curiosamente, também são muito parecidas as razões que me levaram a optar por não ter filhos.
Agora, que vejo a minha Mãe desaparecer lentamente, sinto tudo isso de uma forma ainda mais premente...
Enviar um comentário