2 de Junho de 2014:
É hoje. Não dormi quase nada. Felizmente tenho a manhã toda ocupada na faculdade e a mente pode abster-se um pouco deste dia e das suas consequências.
Vou almoçar com a minha melhor amiga: restaurante calmo entre árvores. A conversa agradável passa também pelos acontecimentos que poderão ocorrer hoje. Regresso à faculdade por volta das 14.30. Abro o mail e vejo uma mensagem dos meus advogados: a parte contrária, que levou quase seis anos a protestar contra as nossas contas, aceita-as e reitera o pedido para que possamos chegar a um acordo extrajudicial pelo que pede uma soma compensatória dez vezes inferior à que tem pedido nestes quase seis anos. Telefono aos meus advogados. Estou em choque. Choque por ver que a esperança tinha fundamento. Choque por estar incrédula que, depois de tanto me massacrarem, peçam dez vezes menos. Dez vezes!
Dou luz verde aos advogados que continuem a negociação e saio da faculdade rumo ao meu campo. Perdi toda e qualquer concentração e, hoje e agora, a minha vida assume prioridade.
Estou quase a chegar ao meu campo quando recebo novo telefonema. São os meus advogados. A parte contrária aceita a nossa proposta: quinze vezes inferior ao que eles pediam e eles aceitaram. Na coincidência cósmica, enquanto recebo este telefonema, vejo o carro do meu, agora sim, ex-marido passar por mim na direcção contrária no carro que eu lhe paguei. Eu rumo à vida, ele vai sair dela. Aprecio a coincidência neste dia em que estou tão alerta para tudo. Não o via há anos e, logo neste dia, justo neste dia, vejo-o na fugacidade de quem sai da minha vida.
Chego atordoada ao escritório dos meus advogados:
- É possível? - Pergunto. - Eles aceitaram a nossa contraproposta?
- Sim, Doutora. - Responde em serena calma a advogada. - Ganhámos! - Acrescenta, como que a dar-me a certeza de que isto aconteceu.
Não acredito que isto possa estar a acontecer! Nem em sonhos pensei que pudesse chegar a um acordo destes. Como é que alguém que ousa pedir-me milhares e milhares, que enfrenta dois processos judiciais como Réu à base de mentiras, que enfatiza a mentira, que recorreu a um escritório de advogados que só o nome dos sócios mete medo a qualquer juiz, que se usou de todos os esquemas permitidos pela justiça durante quase seis anos aceita um acordo quinze vezes inferior ao que queria? Um acordo que não lhe vai chegar para os honorários desses advogados e para as custas judiciais?
Ganhei! A minha verdade era a verdade. Continuo na perplexidade. Agora que há acordo e que tudo vai acabar, parece-me tudo simples demais. Seis anos para isto? Eu fui refém da lei e da justiça e de um homem mau para isto? E a justiça deixou?
E esse homem mau sai daqui com menos de um terço do que aquilo que eu inicialmente lhe ofereci? Que vergonha! Quando a justiça finalmente pediu provas e eles se viram na contingência de as não terem mudou tudo. E mudou tudo na rapidez fulgurante. Só me pergunto porque é que a justiça não pediu provas à parte contrária logo de início e me deixou neste limbo de sofrimentos e liberdades suspensas durante todo este tempo?
Ganhei! Mas estou cansada demais para estar exultante. O calvário ainda não acabou. Há toda uma teia burocrática a seguir e logo após sigo para Estrasburgo. A minha luta agora vai ser travada em sede internacional contra o Estado Português. Ganhei a batalha contra o homem mau mas o Estado deste país pretensamente civilizado, moderno e democrático não pode ficar incólume. O meu divórcio ainda não acabou. A justiça deste país não me serviu, bem pelo contrário, só me atrapalhou. A justiça deste país foi conivente com mentiras ditas e lavradas ao arrepio de provas durante quase seis anos e isso eu não posso tolerar. Por todas as mulheres injustiçadas como eu, por todas as que não têm os meus privilégios, a minha voz, a minha instrução e os meus recursos, por todas elas e porque não posso ser cúmplice do que me sucedeu, sigo para Estrasburgo.
5 comentários:
Não sei se parabéns é a palavra indicada mas ela aqui fica: Parabéns! Pela perseverança e pelo exemplo que muitas mulheres não podem (e outras não querem) seguir! A tua história diz-me muito porque passei por uma com contornos semelhantes (mas não na qualidade de esposa).
Força para a próxima batalha!
Obrigada.
Depois de ler e de ter estado expectante por saber quando sairia o capítulo final desta história, foi só o que consegui pensar.
Obrigada também por mim.
E ao começar a escrever este agradecimento, as lágrimas chegaram-me aos olhos.
Muito, muito obrigada por ir até Estrasburgo.
Apesar de 45 anos de casamento feliz sou capaz de imaginar os seus seis anos de pesadelo!
Uma vida feliz daqui para o futuro é o que lhe desejo!
Fico feliz com este desfecho, apesar de nada haver de felicidade num processo como este. E gabo-te a garra de seguires para os tribunais internacionais contra o Estado português. Força nisso e, principalmente, boa nova vida!
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