28 de junho de 2011

Treze anos

Hoje.
Sabes Mãe, o ano passado só me lembrei era hoje. Ia-me esquecendo e esse facto ia dando comigo em doida. Assustou-me que este dia quase me tivesse passado com ligeireza. Como se
Te esquecesse e isso fosse imperdoável. Este ano fiz por não me esquecer. Não que eu goste deste dia. Não que eu sequer goste de me lembrar deste dia e Tu sabes como eu , o Pai e a Mana não nos comunicamos hoje, guardando-nos de partilhar seja o que for que Te lembre entre nós. Sabemos que nos lembramos hoje mas não o verbalizamos entre nós. Fazemos como se nos esquecessemos de hoje e amanhã está tudo igual. É um dia de interregno, um pacto tácito e silencioso. Mas estás cá.
Sim, de facto não gosto deste dia mas esquecer-me dele seria como passar por cima do que aconteceu. É irrevogável este dia nas nossas vidas e, por isso, eu não o quero apagar por muito má que seja a lembrança e mais dura a sensação desta mutilação em que ficámos.

Sabes Mãe, este ano há o Manel. Se estivésses cá irias vê-lo crescer ainda durante muito tempo. Tem o polegar esquerdo igual ao Teu, com a articulação lassa que passaste à Mana e que ela lhe passou. Gene forte esse! É parecido com a Mana, muito parecido, aliás, em versão cabelinho escuro como o pai dele. Já devias esperar que os nossos genes recessivos não teriam hipótese com morenos, não é? Mas é lindo. Simpático e meigo. Lembra-me tanto a Mana quando eu a via bebé e Te via a Ti com ela. E agora vejo-a com aquele bebé e inventa, como Tu, palavras novas para falar com ele e usa outras que eram Tuas e que ela, crescendo a ouvi-las, as perpetua no filho. Eu fico ali, Mãe, a observar em terceira pessoa e acho aquilo maravilhoso e pergunto-me o que sentirias se a visses segurar o bebé dela ao colo. E ela cada vez mais parecida contigo, mais do que antes, ela que sempre foi, de nós, a mais parecida contigo. Até nisto, nesta maternidade, ela te perpetua.

Mas sabes Mãe, sempre que eu vejo a Mana com o bebé Manel lembro-me de Ti, da Tua ausência, do como dói, do como o vazio do espaço que ocupavas é tão grande e inultrapassável. E penso como Te vou dar a conhecer ao Manel. Sabes que também penso nele? No desfalcado que ele é por não conhecer a Avó materna. No desfalcado que ele é face à mãe e à tia que conheceram todos os avós, a bisavó e que Te tiveram a Ti, nessa coisa inexplicável que Tu eras. Dói saber que ele não Te tem aqui e que serás para ele palavras, fotografias e histórias de dias bons.

Pois é Mãe, não queria que este dia passasse sem esta lembrança de Ti. Nunca pensei o que seria estar treze anos sem Ti. Chegar aqui. Quando aquilo aconteceu por fim parecia que o Tempo acabava. Hoje vejo que o Tempo prosseguiu. Não me imaginava treze anos depois. Estou aqui. Vim morar para a Tua casa e era-me impossível pensar que assim fosse. Hoje vou falar com o engenheiro que vai dar um projecto aos terrenos que eram Teus e que hoje sou eu que administro, seja lá o que for que é essa administração. Não pensava nada disto, mas é isto que tenho. Agora páro para olhar em volta e penso que não queria que fosse de outra maneira. Às vezes vou regar o jardim e vejo-Te num vestidinho de riscas azuis a regar. Outras vezes oiço-Te cantar aqui por casa e tem vezes que podia jurar que Te ouvi acender uma luz no barulho que fazias com os interruptores e que eu reconhecia seres Tu.

Vais estar sempre aqui, Mãe. Amor maior e dor maior da minha Vida. Mutti querida que Te tenho saudades todos os dias por muitos treze anos que passem...

7 comentários:

Turista disse...

Querida Blonde, um abraço.
Lindo, este texto de amor e saudade.

Ältere Leute disse...

Was kann man noch dazu sagen?
Liebsten Gruss! Beijinho ( auf portugiesische Art )!

antonio ganhão disse...

Um tributo de amor. Com um traço de sentido para tudo o que nos vai faltando, de forma irreparável.

Zélia Parreira disse...

Um abraço.

Cristina Torrão disse...

Querida Blonde, não me leves a mal, isto é só uma sugestão: não seria melhor quebrar esse pacto de silêncio e repartir estes sentimentos com o Pai e a Mana? Ou, pelo menos, com a Mana (com um Pai, a comunicação, às vezes, não é fácil, eu que o diga).

Enfim, a vida é tua, foi só uma sugestão...

Olá Amor disse...

Enfim, palavras para quê! Está tudo dito! Mas que sobretudo as boas memórias sejam sempre superiores às más, pois assim há sempre uma razão para continuar!
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Este é um post que me dá uma referência, pois foi mais ou menos por esta altura no ano passado que por aqui vim parar a primeira vez vez, e desde aí tenho vindo sempre. Por estes textos maravilhosos, simples e carregados de emoção, é que eu mantenho a assiduidade! Tudo de bom!!

George Sand disse...

Não é um comentário que venho deixar. É um abraço. Só uma abarço, mesmo que virtual e mesmo que de uma desconhecida. Um abraço Blonde!