28 de fevereiro de 2014

Reviver o Primeiro Éden

Eu teria talvez 14 ou 15 anos. Já o seguia desde os 7 e já sabia que um dia iria àqueles sítios todos que os meus olhos viam arregalados na TV. Não sei porquê mas "O Primeiro Éden" marcar-me-ia mais profundamente do que todas as outras séries e livros dele que eu devorava com o apetite de quem contava as páginas que faltavam para o fim e as poupava para o livro render.
Os anos passaram e a Vida chegou. Parti vezes sem conta e umas vezes dei-me conta outras não. Outras, ainda, os sítios apareciam sem que eu os tivesse procurado deliberadamente. Foi assim com o Vale das Borboletas em Rodes: só me apercebi de que era ali quando, no táxi entre o aeroporto e o hotel, reparei numa tabuleta a cair de frágil e ressequida que dizia "Valley of Butterflies". Vivi num desassossego nos dias seguintes porque, a partir desse momento o meu propósito em Rodes era ir àquele vale. Uma vez lá chegada foi como se o mundo todo à minha volta se silenciasse. Até o sussurro das folhas das árvores que escureciam o vale e lhe coavam a luz era silêncio. Silêncio o regato e as cascatas. Nada havia à minha volta. Vivi aquelas horas em ânimo e extraordinária paz de espírito tal experiência mística que me aguardara ao cabo de muitos anos.
Ando a rever a série. Nunca mais a revisitei desde esses meus adolescentes 14 ou 15 anos. Esporadicamente regresso ao livro e dentro das suas páginas guardo a carta que ele me escreveu. Parecia apenas lógico que a carta fosse para ali. Agora, do alto da minha grande idade de décadas, revejo a série e dou por mim no espanto. Os sítios em que ele esteve e de que eu já me esquecera: estive lá. Estive ali naquele vale, ali naquela colina, ali mesmo naquela bancada daquele anfiteatro em Éfeso. Desci aquelas escadas em Knossos e estive naquele corredor dos gladiadores em El Djem. Esquecera-me no entretanto, mas o inconsciente é mais forte e não creio na coincidência. Fui levada àqueles sítios por impulsos que me ficaram dormentes desde a juventude. E fui levada lá porque nesses doces tempos eu fiz profissão de fé de que não morreria sem ver com os olhos ao vivo todos aqueles locais.
Hoje estou feliz pelas oportunidades da Vida. Feliz por ter feito por elas e não me ter defraudado. Feliz porque a menina das trancinhas louras conseguiu realizar uns quanto e muitos dos sonhos que tinha e que trouxe para a vida adulta. Faltam-me uns tantos outros. Lá chegarei. Por enquanto, encontro-me com um comigo feliz ao aperceber-me do que já consegui no Éden sem me ter dado conta:
- Éfeso, check;
- Knossos, check;
- El Djem, check;
- Vale das Borboletas, check;
- Saqqara, check;
- Montanhas do Atlas, check;
- Mesquita de Córdoba, check;
- Alhambra, check;
- Sahara, check;
- Nilo, check;
- Mar Vermelho, check;
- Egeu, check;
- Plitvice, devo tratar dele em Agosto próximo.
Tenho sempre tanto receio de não estar à altura dos sonhos da menina das trancinhas louras. Penso muitas vezes que falhei, que não me esforcei mais, que fui fraca e acomodada mas, nestes últimos dias, enquanto contemplo memórias e listas mentais, apercebo-me de que talvez eu tenha chegado Aqui com mais promessas infantes realizadas do que a maioria dos mortais e, talvez, portanto, a menina de antigamente tenha, afinal, razões para me sorrir porque eu não a envergonhei neste trajecto.
Agora vou poupar para as Galápagos porque sei que há lá uma miúda de trancinhas louras que me vai levar aos sítios que ele me mostrou.

1 comentário:

Ältere Leute disse...

A minha lista tem sete destes lugares ( checked ) sem Galápagos - que não está nas minhas ambições ! Plitsvice é o lugar onde escrevi, e de onde enviei,(2007), a carta para uma jovem luso-croata residente em Zagreb. Carta cuja resposta poderia ter sido um encontro em Lisboa, anos depois : mas não aconteceu...