Chego de novo ao Grand Canyon, um regresso ao canyon mas a um sítio onde nunca tinha estado: Eagle Point. Acho que se percebe bem a designação de Eagle Point, a formação rochosa que a erosão esculpiu em forma de águia de asas abertas. Uma águia colossal, como colossal é este canyon. Eagle Point é no West Rim, a margem ocidental, digamos assim. Em 2010, estive no South Rim e foi aí que me apaixonei perdidamente pelo Grand Canyon jurando-lhe amor eterno e eterno retorno. O East Rim é Horseshoe Bend, onde estive já nesta viagem. Falta-me só o North Rim para completar o círculo.
Percebo bem porque os Hualapai creiam este sítio como território sagrado. Também eu me sinto em solo sacralizado por uma Natureza-Mãe omnipotente e eterna. Fotografia nenhuma consegue alcançar a dimensão rochosa que os meus olhos contemplam boquiabertos. A espectacularidade do Grand Canyon é um eufemismo. Tento palavras nas línguas que conheço e nenhuma consegue exprimir este gigantismo. Sinto o canyon com o coração, a alma e os olhos. Renovo-lhe promessas de amor eterno e agradeço à Vida que me permitiu conhecê-lo e ao Planeta que o esculpiu. Já corri mundo, é certo, mas o Grand Canyon está merecidamente num dos lugares cimeiros das coisas mais surpreendentes que já me foram dadas a ver. A Natureza livre e esplendorosa é isto.
27 de fevereiro de 2017
23 de fevereiro de 2017
Dia 13: The Joshua Tree(s)
Os U2 têm um album chamado The Joshua Tree (nem sei como foram desencantar o nome) e isto são as joshuas trees, as árvores de Josué. Nem cactos, nem árvores comuns, espinhosas. São endémicas no Arizona, no Nevada, no Utah e na Califórnia. Um dos locais com maior aglomeração desta espécie é aqui entre Kingman e o Grand Canyon. Começam por ser ralas na paisagem até que se transformam numa floresta densa, como densa pode ser uma floresta no deserto.
Para trás ficou a Route 66. Regresso às paisagens áridas e desoladas que tanto me acolhem a alma. Antecipo o canyon, o grande, e sigo estrada fora sempre na expectativa do que trará cada quilómetro do percurso.
Para trás ficou a Route 66. Regresso às paisagens áridas e desoladas que tanto me acolhem a alma. Antecipo o canyon, o grande, e sigo estrada fora sempre na expectativa do que trará cada quilómetro do percurso.
20 de fevereiro de 2017
Dia 12: Kingman, Arizona, Route 66
Já tinha estado em Kingman, no Arizona, há uns anos. De passagem e já nessa altura me pareceu o que agora me parece: uma espécie de Entroncamento cá do sítio. A Route 66 vem dar aqui mas é uma Route 66 descaracterizada, uma espécie de via rápida que chega a um aglomerado urbano desconexo e asfixiado por camiões e trânsito que surge não sei de onde mas que para aqui converge como convergem todos os comboios e vagões e vias férreas, ou assim me parece.
Seligman era uma coisa turística que vive à custa da Route 66. Aqui, a Route 66 está metida à força numa espécie de downtown onde uns diners e um museu tentam dar uns arremedos de qualquer coisa passada que deve ter sido importante e que vive mais de imaginários do que de realidades presentes.
Fico num hotel rockabilly pretensamente nostálgico, pretensamente decadente como uma música da Lana Del Rey onde uma trupe de franceses tenta fazer-se entender por entre "rs" assanhados e cara de quem está perdido e miserável por não fazer nada desta América que não é exactamente como a dos filmes mesmo que, às vezes, seja um pouco ou muito como nos filmes. Detenho-me a dar uma volta por este hotel, pelo jardim e pelos meandros de blocos de quartos e salas e o restaurante que querem à viva força fazer-se genuínos e herdeiros do espírito da Route 66. Não conseguem. Mas nesse pastiche talvez, afinal, consigam a genuidade. Na minha mente toca uma canção do Chris Isaak.
Seligman era uma coisa turística que vive à custa da Route 66. Aqui, a Route 66 está metida à força numa espécie de downtown onde uns diners e um museu tentam dar uns arremedos de qualquer coisa passada que deve ter sido importante e que vive mais de imaginários do que de realidades presentes.
Fico num hotel rockabilly pretensamente nostálgico, pretensamente decadente como uma música da Lana Del Rey onde uma trupe de franceses tenta fazer-se entender por entre "rs" assanhados e cara de quem está perdido e miserável por não fazer nada desta América que não é exactamente como a dos filmes mesmo que, às vezes, seja um pouco ou muito como nos filmes. Detenho-me a dar uma volta por este hotel, pelo jardim e pelos meandros de blocos de quartos e salas e o restaurante que querem à viva força fazer-se genuínos e herdeiros do espírito da Route 66. Não conseguem. Mas nesse pastiche talvez, afinal, consigam a genuidade. Na minha mente toca uma canção do Chris Isaak.
17 de fevereiro de 2017
Dia 12: Peach Springs, Route 66
Saio de Seligman de volta ao asfalto da Route 66 e aos espaços abertos. A linha de comboio segue ao lado e ao lado passam os colossos portentosos que se estendem serpenteando na paisagem por milhas e milhas. Este aqui, como tantos outros comboios, tem dois andares de contentores em cada vagão. Penso na força bruta que é necessária à deslocação destas mega-toneladas de transporte.
Anda uma tempestade a rondar a estrada. Os relâmpagos enchem o céu e a escuridão das nuvens e da carga de água infunde medo. Locus horrendus, a natureza selvagem e bruta que tanto inspirava os poetas românticos e que igualmente me fascina e atrai na sua ferocidade. Obviamente que uma coisa é gostar de observar a tempestade, outra coisa é levar com ela em cima ao volante. Já apanhei disso vezes sem conta nesta viagem e, desta vez, é preferível parar e deixá-la passar.
Recolho-me em Peach Springs, o centro administrativo da Reserva dos Hualapai em território Mojave. Tempos houve, no esplendor da época dourada da Route 66, em que deveria ter sido uma cidade vibrante. Agora é mais uma ruína na estrada. As estações de serviço abandonadas à ferrugem do tempo. Solidão e os Hualapai que se vêm abastecer ao supermercado da Reserva. Olham para mim como que a perguntar o que é que esta branca desta turista aqui está a fazer, porque é que parou neste nenhures. Deixo a tempestade passar e retomo o caminho por esta pobre e abandonada Route 66.
Anda uma tempestade a rondar a estrada. Os relâmpagos enchem o céu e a escuridão das nuvens e da carga de água infunde medo. Locus horrendus, a natureza selvagem e bruta que tanto inspirava os poetas românticos e que igualmente me fascina e atrai na sua ferocidade. Obviamente que uma coisa é gostar de observar a tempestade, outra coisa é levar com ela em cima ao volante. Já apanhei disso vezes sem conta nesta viagem e, desta vez, é preferível parar e deixá-la passar.
Recolho-me em Peach Springs, o centro administrativo da Reserva dos Hualapai em território Mojave. Tempos houve, no esplendor da época dourada da Route 66, em que deveria ter sido uma cidade vibrante. Agora é mais uma ruína na estrada. As estações de serviço abandonadas à ferrugem do tempo. Solidão e os Hualapai que se vêm abastecer ao supermercado da Reserva. Olham para mim como que a perguntar o que é que esta branca desta turista aqui está a fazer, porque é que parou neste nenhures. Deixo a tempestade passar e retomo o caminho por esta pobre e abandonada Route 66.
14 de fevereiro de 2017
Dia 12: Seligman, Route 66
O letreiro prenuncia o que deverei encontrar. As letras carcomidas pelos elementos indiciam outros tempos. Outrora um local de paragem obrigatória, Seligman é hoje apenas uma atracção turística, um local de souvenirs e memorabilia, uma cidade tão desvanecida como as tintas das letras do letreiro que a anuncia.
Pensei que ia encontrar hordas de turistas mas nem isso. As lojas tristes e kitsch estão plantadas na berma de uma estrada que vive só como memória passada. Faço a única coisa que me é permitido fazer, entro no espírito do passadismo amante do turista e entro nas lojas.
Compro as bugigangas da praxe, as t-shirts para os meus sobrinhos, os magnets para o frigorífico. Faço em Seligman a única coisa que Seligman deixa que lhe façam: compras de insignificâncias que me dirão no futuro "Estive lá!", neste aqui para turista ver, propósito único da existência de Seligman neste nosso presente.
Sigo viagem.
Pensei que ia encontrar hordas de turistas mas nem isso. As lojas tristes e kitsch estão plantadas na berma de uma estrada que vive só como memória passada. Faço a única coisa que me é permitido fazer, entro no espírito do passadismo amante do turista e entro nas lojas.
Compro as bugigangas da praxe, as t-shirts para os meus sobrinhos, os magnets para o frigorífico. Faço em Seligman a única coisa que Seligman deixa que lhe façam: compras de insignificâncias que me dirão no futuro "Estive lá!", neste aqui para turista ver, propósito único da existência de Seligman neste nosso presente.
Sigo viagem.
10 de fevereiro de 2017
Dia 12: Comboios na Route 66
É preciso vir aqui a estes espaços de gigantismo e colosso para vermos o que são comboios a perder de vista. Na Europa nada há desta dimensão. Vale a pena parar o carro e contar os minutos e vagões que percorrem a paisagem até ao horizonte. Há comboios tão grandes que precisam de duas ou três auto-motoras à frente e mais umas tantas atrás. Nunca consigo contar os vagões. Perco-me na contagem e na perplexidade de ver estas monstruosidades. Chego a estar dez minutos inteiros a ver o comboio passar sem lhe ver o fim e o meu cérebro só pensa no incrível que é esta maquinaria toda.
A Route 66 segue muitas vezes paralela à via férrea e, na paisagem vazia de gente, o comboio traz vida e movimento à solidão da vastidão. Deixo a mente pensar no destino que levarão os comboios que os olhos vêem e sigo o meu caminho sem saber exactamente que destino levo...
A Route 66 segue muitas vezes paralela à via férrea e, na paisagem vazia de gente, o comboio traz vida e movimento à solidão da vastidão. Deixo a mente pensar no destino que levarão os comboios que os olhos vêem e sigo o meu caminho sem saber exactamente que destino levo...
7 de fevereiro de 2017
Dia 11: Eis que começa a Route 66
Neste país de contrastes e imensidões bastam três horas de condução para a planície abrasadora e desértica dar lugar à frescura alpina. O deserto encarnado e seco transforma-se em floresta de coníferas verdejantes e a temperatura desce abruptamente. Preciso de um casaco. Um aguaceiro rápido molha o chão e o cheiro a pinho perfuma o ar da montanha. Chego a Flagstaff no Arizona e ao começo do meu percurso da mítica Route 66.
Há uns anos valentes fiz um pequeno trecho da Route 66 de Kingman a Oatman (Oatman, o local onde hoje acaba a Route 66). Na verdade, a Route 66 já não existe. Foi substituída por interstates e highways e o que resta são uns pedaços de estrada que coincidem com a antiga Route 66, assinalados com sinais para turista ver. Este ano pretendo ir de Flagstaff a Kingman, passando por Seligman, curiosamente o pedaço da Route 66 mais icónico e preservado. Vamos ver.
A Route 66 começava em Chicago, no Illinois, e ia até à Califórnia. Era a estrada dos sonhos, a estrada rumo ao Oeste prometido. Viveu o apogeu das grandes migrações internas nas décadas de 1950 e 60 e, no que ainda resta, perdura a memória kitsch desses tempos. Fico num desses hotéis nostálgicos das décadas do Elvis e do rock 'n' roll. Chego mesmo a tempo da happy hour no bar do hotel. Lá fora o dia cai nublado pelos restos de chuva e eu penso no país que atravesso e na disparidade sublime das paisagens que os meus olhos viram e o meu corpo sentiu neste dia único e absolutamente maravilhoso. Sorvo o resto do dia e espero o de amanhã. Sinto-me livre e agradeço o privilégio...
Há uns anos valentes fiz um pequeno trecho da Route 66 de Kingman a Oatman (Oatman, o local onde hoje acaba a Route 66). Na verdade, a Route 66 já não existe. Foi substituída por interstates e highways e o que resta são uns pedaços de estrada que coincidem com a antiga Route 66, assinalados com sinais para turista ver. Este ano pretendo ir de Flagstaff a Kingman, passando por Seligman, curiosamente o pedaço da Route 66 mais icónico e preservado. Vamos ver.
A Route 66 começava em Chicago, no Illinois, e ia até à Califórnia. Era a estrada dos sonhos, a estrada rumo ao Oeste prometido. Viveu o apogeu das grandes migrações internas nas décadas de 1950 e 60 e, no que ainda resta, perdura a memória kitsch desses tempos. Fico num desses hotéis nostálgicos das décadas do Elvis e do rock 'n' roll. Chego mesmo a tempo da happy hour no bar do hotel. Lá fora o dia cai nublado pelos restos de chuva e eu penso no país que atravesso e na disparidade sublime das paisagens que os meus olhos viram e o meu corpo sentiu neste dia único e absolutamente maravilhoso. Sorvo o resto do dia e espero o de amanhã. Sinto-me livre e agradeço o privilégio...
3 de fevereiro de 2017
Dia 11: Uma curva na estrada
Umas milhas depois de Horseshoe Bend, a estrada segue por sítio nenhum. O canhão dá lugar à altitude e lá em baixo a planície infinita cortada por um fosso que mais não é do que uma sombra escura na paisagem, o Rio Colorado que vai esculpindo as gargantas do Grand Canyon. Mal se distingue a esta distância. Camuflado, esconde-se nas profundezas.
Há uma curva na estrada antes da descida para a planura e os olhos não cessam de contemplar a imensidão majestosa destas paisagens...
Há uma curva na estrada antes da descida para a planura e os olhos não cessam de contemplar a imensidão majestosa destas paisagens...
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