Foi. Nem bem nem mal. Passou-se. Dificilmente tenho outro 2009 tão inolvidável e surpreendente no bom todo que o bom tem.
Só que, pensando bem, eu tive este 2010 de habituações mornas e caminhos aplanados porque me dei 2009. Sim, talvez tenha sido a falta da adrenalina nova, dos anseios todos, das novidades que agora me dão a ideia de um 2010 meio insosso, meio acomodado. Ou então sou eu que sou uma mulher de ímpares e recordo melhor os anos e as idades desemparelhados. Que bom que é tudo ímpar em 2011.
O que eu acho no fundo é que 2009 me habituou mal, muito mal. Foi tão vivido e tão inesperado que se tornou num clímax de Vida, da minha. E como os clímaxes se esvaziam, porque é da sua natureza imanente o esvaziamento, eu aterrei mal na fase pós e o pós leva-nos ao nível do chão e tira-nos das alturas insuportáveis de manter. Em vez de voar, como em 2009, caminhei e as minhas asinhas nos pés não apreciaram muito terem voltado a ser solas (podem até ser solas de pumps mega-fashion, mas solas).
Tive o meu sobrinho: a energia de saber que ele vinha aí e depois o confronto com a pessoa ele quando nasceu. Não sei se foi amor à primeira vista porque o estranhei e estranhei tudo. Mas agora, aos dois meses, ele já me deu tempo e eu descubro que ele é a coisa mais adorável e gostável da Vida. Ainda me pasmo saber a Mana mãe e mais ainda quando lhe oiço a palavra "filho" neste novo vocabulário que agora nos entra Vida adentro. É bom este episódio.
De resto, continuei a domar esta Casa de ecos e espaços, de passados e fantasmas. Já vou habitando as divisões quase todas em vez de morar apenas no meu quarto, na biblioteca e pouco mais com medo das paredes que falavam. Aos poucos vai ficando, ou já está mesmo, irreconhecível face aos diversos passados que por aqui passaram desde a morte da Mãe ao meu não-casamento. Teria sido mais fácil vendê-la e Deus sabe que um tempo houve em que essa ideia era uma obsessão. Acabar com tudo. Vender o passado. Mas como é que eu ia vender os fantasmas? E eu, que depois de a Mãe morrer lhe quis calçar à força os sapatos de matriarca, ia ser matriarca onde? Era aqui que eu tinha de ficar. Aqui começava a minha luta por um presente novo. Eu começava aqui. Caramba, eu era uma mulher de coragem, ou não? Aqui estou e vou amando a Casa como já a odiei na demonização personificada que lhe conferi.
Foi também o ano de me virar para os terrenos. Com a Casa mais exorcizada virei-me para outra frente: passo a passo. Acho que me estou a sair bem. Mais importante, ando a recolher as peças do meu cadáver, a colá-las para renascer. Se calhar precisei destes doze anos de luto, que nem foram bem de luto, foram de absoluta dilaceração. Esqueci-me da Vida de mim, devastei-me, não-casei-me daquela maneira e só agora estou a emergir num parto que demora. Mas já respiro a plenos pulmões. É bom este ar. Posso até andar cansada, afinal enxotar fantasmas, querer um matriarcado, domesticar a Casa a chicote e ressuscitar terrenos é obra! No meio disto tudo ainda tem de me sobrar tempo para o Tempo de outras coisas, das coisas que nos acontecem a todos e que em todos nos são exclusivas. Se calhar é isso: 2009 foi tão especial porque foi só meu; 2010 foi menos excitante porque trabalhoso, porque cheio de frentes, porque cheio da Vida interrompida há doze anos que gritava para que eu a tirasse das silvas e das heras que lhe tinham crescido por cima. Aqui estou, de foice na mão (mas sem martelo) pronta a continuar o desbaste.
Veremos 2011...
A todos que aqui vêm e se detêm nas frivolidades que por aqui deixo nesta cadeira freudiana: obrigada. Um excelente Ano Novo.
A todos que aqui vêm e se detêm nas frivolidades que por aqui deixo nesta cadeira freudiana: obrigada. Um excelente Ano Novo.